Dedico esse relato a todos que
fizeram parte de uma época que vivíamos sem celulares, uma época que éramos
jovens e tínhamos nossos pais preocupados por não saberem onde andávamos.
Hoje sentado aqui no sofá numa
calma manhã de sábado, recordei do tempo que iniciei minhas andanças pela noite
de São Paulo, eu tinha uns 13 anos e um mundo de coisas novas se abria a minha
frente, novas amizades surgiam e os primeiros convites para as festas e baladas
também, tudo era novidade e eu me joguei dentro daquele turbilhão que era o
início da adolescência.
Na época eu estudava e em breve
eu começaria a trabalhar, os encontros com a galera eram diários, primeiro
durante o dia e depois que comecei a exercer uma função dentro de uma empresa
tive que me contentar com a falta de tempo para as reuniões à luz do dia e passei
a aproveitar mais a noite, mesmo que às vezes tivesse que matar uma aula ou
outra para isso.
Todo fim de semana tínhamos festas,
ou melhor, bailes dentro de garagens fechadas por uma lona pendurado nas lanças
do portão da casa de alguém. Ficávamos sabendo de tudo, onde ia ser, que horas
ia começar, se ia ter muita bebida ou não, quem ia ser o DJ e todas essas
informações eram passadas no boca a boca.
Nos encontrávamos com mais frequência,
conversávamos pessoalmente, não tínhamos celulares, computadores e nem sonhávamos
com isso.
Depois de um tempo as festas não
eram mais suficientes para a minha vontade de querer viver e conhecer coisas
novas, lembro que também a balada perto de casa que íamos aos domingos, não me
satisfazia mais. Comecei a me distanciar dos amigos do bairro, conheci outros
que também eram de perto e parti para novos lugares, mais distantes, mais
pesados, menos conhecidos e a partir desse momento, já não voltava mais para
casa a meia noite, horário que antes era o limite da minha estadia na rua.
Tinha quatorze anos quando
comecei a varar a madrugada, perdido pelas baladas de música eletrônica
tentando me encontrar, percorrendo uma distância enorme para um menino que
ainda era pequeno no meio da grande noite.
Recordo-me que saía da escola na
sexta feira, deixava meu caderno com qualquer um que estivesse a minha frente e
me jogava dentro de um ônibus e mesmo com dinheiro no bolso pedia para passar
por baixo da catraca, alguns cobradores deixavam e de tanto que fazia isso
muitos até já me conheciam, mas também tinham aqueles que não deixavam e se eu
visse que era um desses, eu logo pagava para não criar problemas. Cruzava a
cidade de condução em condução curtia tudo o que tinha para curtir e regressava
vendo o dia clareando através do vidro do transporte coletivo.
Na manhã de sábado eu chegava em
casa as oito e enquanto minha família acordava para o café, eu deitava para
dormir. Eu sabia de alguma forma que tinha que fazer companhia para minha mãe,
então eu sempre procurava acordar na metade da tarde e ter um momento de convivência
que durava pouco, mas existia.
Quando a noite de sábado chegava,
eu começava a me mexer para mais uma vez mergulhar naquele meu universo que me
envolvia cada vez mais, tomava um banho, jantava e partia para repetir o
caminho que fiz no dia anterior rumo ao coração da noite e da juventude do
outro lado da cidade.
Dava tchau para minha mãe, para o
meu pai e meus irmãos:
- Tchau mãe, fique com Deus e boa noite.
Naquela época não pensava, mas
hoje imagino que minha mãe devia ficar muito preocupada, pois via seu menino
sair às oito horas da noite e ir para um lugar que ela não sabia onde era com
pessoas que ela nem sonhava saber quem eram, ela não sabia nada o que poderia
acontecer, só pensava no pior e agora pensando bem acho que ela perdeu muitas
noites de sono por minha causa e com razão.
Foram muitos anos de baladas,
bebedeiras, curtições e tudo isso sem um bendito telefone celular para que
pudessem me achar ou para que eu pudesse dar notícias.
Hoje sentado aqui no sofá em uma
manhã calma de sábado, escrevi superficialmente sobre essa parte da vida que
muitos viveram como eu, mas consegui de uma forma um pouco mais profunda viajar
nas entrelinhas e ir além vendo muito mais do que via naqueles dias e por isso
peço desculpas para minha família por todas as noites que saí de casa e sem
meios de comunicação como os de hoje fiz vocês se preocuparem comigo, desculpas
por ter feito vocês perderem horas preciosas de seus sonos.
Me desculpem por tudo, mas aquelas noites foram
demais para mim, elas são inesquecíveis, elas foram incríveis e por mais que eu
tenha corrido todo tipo de risco, eu passei por tudo e tudo aquilo que vivi foi
maravilhoso. Valeu a pena, pois aquelas noites me trouxeram até aqui e hoje eu
posso pedir desculpas e agradecer a Deus por me proteger e me fazer feliz.
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