Um poeta louco que sonha como poucos

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sábado, 22 de fevereiro de 2014

Outros tempos


Dedico esse relato a todos que fizeram parte de uma época que vivíamos sem celulares, uma época que éramos jovens e tínhamos nossos pais preocupados por não saberem onde andávamos.
Hoje sentado aqui no sofá numa calma manhã de sábado, recordei do tempo que iniciei minhas andanças pela noite de São Paulo, eu tinha uns 13 anos e um mundo de coisas novas se abria a minha frente, novas amizades surgiam e os primeiros convites para as festas e baladas também, tudo era novidade e eu me joguei dentro daquele turbilhão que era o início da adolescência.
Na época eu estudava e em breve eu começaria a trabalhar, os encontros com a galera eram diários, primeiro durante o dia e depois que comecei a exercer uma função dentro de uma empresa tive que me contentar com a falta de tempo para as reuniões à luz do dia e passei a aproveitar mais a noite, mesmo que às vezes tivesse que matar uma aula ou outra para isso.
Todo fim de semana tínhamos festas, ou melhor, bailes dentro de garagens fechadas por uma lona pendurado nas lanças do portão da casa de alguém. Ficávamos sabendo de tudo, onde ia ser, que horas ia começar, se ia ter muita bebida ou não, quem ia ser o DJ e todas essas informações eram passadas no boca a boca.
Nos encontrávamos com mais frequência, conversávamos pessoalmente, não tínhamos celulares, computadores e nem sonhávamos com isso.
Depois de um tempo as festas não eram mais suficientes para a minha vontade de querer viver e conhecer coisas novas, lembro que também a balada perto de casa que íamos aos domingos, não me satisfazia mais. Comecei a me distanciar dos amigos do bairro, conheci outros que também eram de perto e parti para novos lugares, mais distantes, mais pesados, menos conhecidos e a partir desse momento, já não voltava mais para casa a meia noite, horário que antes era o limite da minha estadia na rua.
Tinha quatorze anos quando comecei a varar a madrugada, perdido pelas baladas de música eletrônica tentando me encontrar, percorrendo uma distância enorme para um menino que ainda era pequeno no meio da grande noite.
Recordo-me que saía da escola na sexta feira, deixava meu caderno com qualquer um que estivesse a minha frente e me jogava dentro de um ônibus e mesmo com dinheiro no bolso pedia para passar por baixo da catraca, alguns cobradores deixavam e de tanto que fazia isso muitos até já me conheciam, mas também tinham aqueles que não deixavam e se eu visse que era um desses, eu logo pagava para não criar problemas. Cruzava a cidade de condução em condução curtia tudo o que tinha para curtir e regressava vendo o dia clareando através do vidro do transporte coletivo.
Na manhã de sábado eu chegava em casa as oito e enquanto minha família acordava para o café, eu deitava para dormir. Eu sabia de alguma forma que tinha que fazer companhia para minha mãe, então eu sempre procurava acordar na metade da tarde e ter um momento de convivência que durava pouco, mas existia.
Quando a noite de sábado chegava, eu começava a me mexer para mais uma vez mergulhar naquele meu universo que me envolvia cada vez mais, tomava um banho, jantava e partia para repetir o caminho que fiz no dia anterior rumo ao coração da noite e da juventude do outro lado da cidade.
Dava tchau para minha mãe, para o meu pai e meus irmãos:
- Tchau mãe, fique com Deus e boa noite.
Naquela época não pensava, mas hoje imagino que minha mãe devia ficar muito preocupada, pois via seu menino sair às oito horas da noite e ir para um lugar que ela não sabia onde era com pessoas que ela nem sonhava saber quem eram, ela não sabia nada o que poderia acontecer, só pensava no pior e agora pensando bem acho que ela perdeu muitas noites de sono por minha causa e com razão.
Foram muitos anos de baladas, bebedeiras, curtições e tudo isso sem um bendito telefone celular para que pudessem me achar ou para que eu pudesse dar notícias.
Hoje sentado aqui no sofá em uma manhã calma de sábado, escrevi superficialmente sobre essa parte da vida que muitos viveram como eu, mas consegui de uma forma um pouco mais profunda viajar nas entrelinhas e ir além vendo muito mais do que via naqueles dias e por isso peço desculpas para minha família por todas as noites que saí de casa e sem meios de comunicação como os de hoje fiz vocês se preocuparem comigo, desculpas por ter feito vocês perderem horas preciosas de seus sonos.
 Me desculpem por tudo, mas aquelas noites foram demais para mim, elas são inesquecíveis, elas foram incríveis e por mais que eu tenha corrido todo tipo de risco, eu passei por tudo e tudo aquilo que vivi foi maravilhoso. Valeu a pena, pois aquelas noites me trouxeram até aqui e hoje eu posso pedir desculpas e agradecer a Deus por me proteger e me fazer feliz.


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